28 de mar. de 2021

2/4 - Modelo de Independência entre Ciência e Religião

 

As controvérsias identificadas no modelo de conflito geram desconfiança e questionamentos. Pensando em “preservar a integridade” tanto da ciência quanto da religião, é possível identificar uma segunda abordagem dessa relação, a da Independência. Essa insiste que C&R são esferas da realidade completamente independentes e autônomas, com suas próprias regras e linguagens. “A ciência tem pouco a dizer sobre crenças religiosas e a religião tem poucos a dizer sobre o estudo científico (MCGRATH)”.

Um dos mais conhecidos representantes dessa abordagem é o Paleontólogo Stephen Jay Gould, que propôs os “Magistérios Não Interferentes”, onde ciência e religião ocupam domínios ou áreas de autoridade/competência bem-definidos, que não se sobrepõem ou se cruzam. A regra de Gould é clara: esses dois magistérios, a ciência e a religião (que não cobrem toda a experiência humana), lidam com assuntos diferentes, e então não devem se intrometer na competência alheia. O físico brasileiro Marcelo Gleiser é outro importante representante desse modelo. 

É comum ouvirmos que a ciência se interessa pelo tempo e a religião, pela eternidade; a ciência estuda como funciona o céu e a religião, como ir para o céu. Nós utilizamos com frequência uma variante dessa abordagem dada pelo teólogo americano Langdon Gilkey (1959 – Criador do céu e da terra) que diz que as Ciências Naturais estão preocupadas em fazer perguntas sobre o “como” (lidando com causas secundárias = interações dentro da esfera da natureza), enquanto a teologia faz perguntas sobre o “por que” (relacionadas com as causas primárias = origem e propósito fundamentais da natureza).

Ao olhar dessa forma independente nenhuma conversa é necessária e nem mesmo possível, nem o conflito se justifica, o que caracteriza essa abordagem, de certa forma, como pacificadora. Esse pacifismo resulta numa grande popularidade nos círculos teológicos e científicos, pois fornece liberdade para acreditar e pensar no que prezam os atores em seus próprios campos (ou magistérios) sem forçar uma relação entre eles.

Entretanto, Barbour aponta que a abordagem de independência inevitavelmente compartimentaliza a realidade uma vez que não experimentamos a realidade dessa forma, tão nitidamente dividida, mas em sua totalidade e interconectividade. Ele defende que estes magistérios não podem evitar algum grau de sobreposição e interação, ou seja, eles não são completamente separados.

Assim, podemos perceber a postura de independência muito menos problemática que a abordagem do conflito, embora incompleta. Em tempos de polarização de ideias e extremismos em todas as áreas da nossa vida, incluindo grupos de whatsapp da família, um simples olhar conciliador já fornece benefícios mínimos para o desenvolvimento basal de ambos os campos de estudo.


Referências

BARBOUR, Ian. G. Quando a ciência encontra a religião: Inimigas, Estranhas ou Parceiras. São Paulo: Ed. Cultrix, 2000.

GARROS, T. Ciência e Religião em Perspectiva: inimigas mortais ou amizade a ser (re)descoberta? – Parte 1. 2017. Disponível em: https://www.cristaosnaciencia.org.br/ciencia-e-religiao-em-perspectiva-parte-1/. Acesso em: 28 fev 2021.

MCGRATH, A. Ciência e religião: fundamentos para o diálogo. Tradução de Roberto Covolan. - 1. Ed. – Rio de Janeiro: Thomas Nelson Brasil, 2020. 352 p.

NUMBERS, RL. Terra plana, Galileu na prisão e outros mitos sobre religião e ciência. Tradução de Aline Kaehler – 1. Ed. – Rio de Janeiro: Thomas Nelson Brasil, 2020. 336 p.

STANFORD ENCYCLOPEDIA OF PHILOSOPHY. Religion and Science. Disponível em  https://plato.stanford.edu/entries/religion-science/ Acesso em 14 mar 2021.


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