As controvérsias identificadas no modelo de conflito geram desconfiança e questionamentos. Pensando em “preservar a integridade” tanto da ciência quanto da religião, é possível identificar uma segunda abordagem dessa relação, a da Independência. Essa insiste que C&R são esferas da realidade completamente independentes e autônomas, com suas próprias regras e linguagens. “A ciência tem pouco a dizer sobre crenças religiosas e a religião tem poucos a dizer sobre o estudo científico (MCGRATH)”.
Um
dos mais conhecidos representantes dessa abordagem é o Paleontólogo Stephen Jay
Gould, que propôs os “Magistérios Não Interferentes”, onde ciência e religião
ocupam domínios ou áreas de autoridade/competência bem-definidos, que não se
sobrepõem ou se cruzam. A regra de Gould é clara: esses dois magistérios, a
ciência e a religião (que não cobrem toda a experiência humana), lidam com
assuntos diferentes, e então não devem se intrometer na competência alheia. O
físico brasileiro Marcelo Gleiser é outro importante representante desse
modelo.
É
comum ouvirmos que a ciência se interessa pelo tempo e a religião, pela
eternidade; a ciência estuda como funciona o céu e a religião, como ir para o
céu. Nós utilizamos com frequência uma variante dessa abordagem dada pelo
teólogo americano Langdon Gilkey (1959 – Criador do céu e da terra) que diz que
as Ciências Naturais estão preocupadas em fazer perguntas sobre o “como”
(lidando com causas secundárias = interações dentro da esfera da natureza),
enquanto a teologia faz perguntas sobre o “por que” (relacionadas com as causas
primárias = origem e propósito fundamentais da natureza).
Ao
olhar dessa forma independente nenhuma conversa é necessária e nem mesmo
possível, nem o conflito se justifica, o que caracteriza essa abordagem, de
certa forma, como pacificadora. Esse pacifismo resulta numa grande popularidade
nos círculos teológicos e científicos, pois fornece liberdade para acreditar e
pensar no que prezam os atores em seus próprios campos (ou magistérios) sem
forçar uma relação entre eles.
Entretanto,
Barbour aponta que a abordagem de independência inevitavelmente compartimentaliza
a realidade uma vez que não experimentamos a realidade dessa forma, tão
nitidamente dividida, mas em sua totalidade e interconectividade. Ele defende
que estes magistérios não podem evitar algum grau de sobreposição e interação,
ou seja, eles não são completamente separados.
Assim, podemos perceber a postura de independência muito menos problemática que a abordagem do conflito, embora incompleta. Em tempos de polarização de ideias e extremismos em todas as áreas da nossa vida, incluindo grupos de whatsapp da família, um simples olhar conciliador já fornece benefícios mínimos para o desenvolvimento basal de ambos os campos de estudo.
Referências
BARBOUR, Ian. G. Quando a ciência encontra a religião: Inimigas, Estranhas ou Parceiras. São Paulo: Ed. Cultrix, 2000.
GARROS, T. Ciência e Religião em Perspectiva: inimigas mortais ou amizade a ser (re)descoberta? – Parte 1. 2017. Disponível em: https://www.cristaosnaciencia.org.br/ciencia-e-religiao-em-perspectiva-parte-1/. Acesso em: 28 fev 2021.
MCGRATH, A. Ciência e religião: fundamentos para o diálogo. Tradução de Roberto Covolan. - 1. Ed. – Rio de Janeiro: Thomas Nelson Brasil, 2020. 352 p.
NUMBERS, RL. Terra plana, Galileu na
prisão e outros mitos sobre religião e ciência. Tradução de Aline Kaehler – 1.
Ed. – Rio de Janeiro: Thomas Nelson Brasil, 2020. 336 p.
STANFORD ENCYCLOPEDIA OF
PHILOSOPHY. Religion and Science. Disponível em
https://plato.stanford.edu/entries/religion-science/ Acesso em 14 mar
2021.
Nenhum comentário:
Postar um comentário