Nós
vivemos na “era da informação”, sendo cada vez mais raro a publicação de
estudos feitos por apenas um pesquisador. Um estudo de 2020 aponta que cresceu
nos últimos anos o número de publicações científicas assinadas por mais de mil
autores (um fenômeno conhecido como
hiperautoria). Existem diversas explicações para este fenômeno (pesquisas
globais e colaborativas, uso de equipes e equipamentos, redução de custos, etc).
Assim, o pesquisador solitário está se tornando cada vez menos viável para
grandes inovações científicas. (ANDRADE, 2020 – FAPESP).
Seguindo
este pensamento colaborativo, o modelo do diálogo é uma terceira maneira de
entender a relação entre Ciência e Religião, levando a uma melhor compreensão
mútua entre ambas.
O
filósofo americano Alvin Plantinga, em seu livro Ciência, religião enaturalismo: onde está o conflito? (2018 - Editora Vida Nova) diz que “apesar de haver um conflito superficial, há
uma convergência profunda entre a ciência e a religião teísta”; e, apesar de
haver uma convergência superficial, há um conflito profundo entre a ciência e o
naturalismo” (que ele chama de quase-religião). Essa observação nos leva à
pergunta: “Há divergências entre as duas esferas?”. E a resposta é que sim, há
divergências sim. Mas acredita-se também que esses dois parceiros de conversação
podem aprender um com o outro.
Alister McGrath, químico, biofísico e teólogo, um dos mais maiores autores da atualidade no estudo de ciência e religião diz que: “Nem a ciência nem a religião podem fornecer uma descrição total da realidade. No entanto, juntas elas podem oferecer uma visão estereoscópica da realidade negada àqueles que se limitam à perspectiva de apenas uma disciplina” (MCGRATH, 2019 – pg 17). É no mínimo questionável um cientista limitar suas perspectivas e potencialidades em conhecer as realidades disponíveis. McGrath ainda argumenta que o diálogo entre C&R nos permite apreciar identidades, forças e limites distintos de cada parceiro de conversa, e nos oferece uma compreensão mais profunda das coisas do que a religião ou a ciência poderiam oferecer por si só.” (MCGRATH, 2019 - pag. 20). Além disso, McGrath, que é professor e diretor do Centro Ian Ramsey de Ciência e Religião da Universidade de Oxford, sugere que ciência e religião são capazes de interagir em um diálogo significativo sobre algumas das grandes questões da vida, mas não como uma conversa acolhedora e não crítica, muitas vezes tendendo a uma agradável, mas injustificada assimilação de ideias. A ideia dele é um diálogo robusto e desafiador (quase que uma banca de doutoramento), investigando questões profundas e potencialmente ameaçadoras sobre a autoridade e os limites de cada participante e cada disciplina.
“A ciência pode purificar a religião do erro
e da superstição, a religião pode purificar a ciência da idolatria e dos falsos
absolutos”. Nesta célebre frase, o papa João Paulo II parece incentivar o
diálogo entre C&R, ao passo que o Papa Bento XVI propõe, por sua vez, uma
relação de autonomia e distinção, lembrando mais a abordagem da independência, mas nunca uma oposição (AGOSTINI, 2013). Outra frase constantemente citada é “a ciência sem a religião é manca, a religião
sem a ciência é cega”. Essa frase é do físico e ganhador do prêmio Nobel
Albert Einstein e, apesar de seu conceito peculiar de religião, traz robustez à
possibilidade do diálogo ao invés do conflito.
Após
essas duas famosas citações no debate de C&R, pode-se dizer que as
explicações científicas e religiosas assumem formas diferentes, mesmo quando
refletem sobre as mesmas observações. Assim, abordagens dialogais permitem ou
incentivam o aprimoramento ético, estético e espiritual de determinadas
questões e, pensando em potencializar a construção do conhecimento, é desejável
fomentar o diálogo ao invés do conflito. Ian Barbour, o físico e teólogo
americano proponente desta tipologia em 4 modelos, considera esse provavelmente
o modelo mais satisfatório do possível leque de abordagens.
Referências:
AGOSTINI, N. Igreja católica e ciências: por uma cultura do diálogo e da vida. Revista Pistis & Praxis: Teologia e Pastoral, vol. 5, núm. 1, enero-junio, 2013, pp. 185-205.
ANDRADE,
R.O. Escrito a muitas mãos. Pesquisa Fapesp, n. 289, 2020. Disponível em: https://revistapesquisa.fapesp.br/escrito-a-muitas-maos/
. Acesso em 13 mar 2021.
BARBOUR, Ian. G. Quando a ciência encontra a religião: Inimigas, Estranhas ou Parceiras. São Paulo: Ed. Cultrix, 2000.
GARROS, T. Ciência e
Religião em Perspectiva: inimigas mortais ou amizade a ser (re)descoberta? –
Parte 2. 2017. Disponível em: https://www.cristaosnaciencia.org.br/ciencia-e-religiao-em-perspectiva-parte-2/.
Acesso em: 28 fev 2021.
MCGRATH, A. Ciência e
religião: fundamentos para o diálogo. Tradução de Roberto Covolan. - 1. Ed. –
Rio de Janeiro: Thomas Nelson Brasil, 2020. 352 p.
STANFORD ENCYCLOPEDIA OF
PHILOSOPHY. Religion and Science. Disponível em
https://plato.stanford.edu/entries/religion-science/ Acesso em 14 mar
2021.
Nenhum comentário:
Postar um comentário